O Discurso de Tarcísio e a Encruzilhada Institucional do Brasil

Introdução
O discurso do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, na Avenida Paulista neste 7 de setembro de 2025, representa um marco na reconfiguração do cenário político nacional. Ao defender abertamente Jair Bolsonaro como "o nosso candidato", criticar nominalmente o ministro Alexandre de Moraes e o Supremo Tribunal Federal (STF) por uma suposta "imposição de um poder sobre o outro", Tarcísio moveu-se de forma decisiva do campo da gestão técnica para o da liderança política de um movimento conservador que busca respostas para a mais grave crise institucional da Nova República. A análise de sua fala, portanto, não deve se ater à superfície da retórica de palanque, mas sim às suas raízes nos princípios do Estado de Direito e da Ordem Institucional, cujas tensões atuais têm gerado severas consequências para a estabilidade e o desenvolvimento do país.
Esta análise irá diagnosticar as causas profundas que motivaram o tom do discurso, conectar a instabilidade política à deterioração do ambiente de negócios e, por fim, avaliar as propostas apresentadas, como a anistia, como caminhos possíveis para a restauração da coesão social e da normalidade democrática.
O Diagnóstico da Hipertrofia de um Poder
A crítica central de Tarcísio de Freitas não é uma mera bravata contra adversários, mas a verbalização de uma percepção crescente em diversos setores da sociedade: a de que o equilíbrio entre os Três Poderes, pilar do Estado Democrático de Direito, está comprometido. Ao afirmar que há uma "imposição de um poder sobre o outro", o governador articula uma tese conservadora clássica: a de que a liberdade e a prosperidade dependem de um governo com poderes limitados e bem definidos, onde nenhum poder pode se agigantar sobre os demais.
O alvo principal, o STF, é visto por essa ótica não como o guardião da Constituição, mas como um agente que tem extrapolado suas prerrogativas por meio de um ativismo judicial que legisla, investiga e julga em um vácuo de accountability. A defesa de Bolsonaro e a conclamação para que o povo o "deixe ir para a urna" são enquadradas como um apelo à soberania popular, o mecanismo primário de legitimação do poder, em contraponto a decisões de um corpo não eleito.
Dados e Evidências
- Fonte 1: Segundo dados do último
Índice de Confiança na Justiça
da FGV, a desaprovação do STF atinge 62% entre os eleitores que se identificam como de direita ou centro-direita, indicando uma profunda desconexão entre a Corte e uma parcela significativa da população. - Fonte 2: Relatórios de risco político de consultorias internacionais, como a
Eurasia Group
, têm consistentemente apontado o ativismo judicial brasileiro como um dos principais entraves à segurança jurídica e à atração de investimentos de longo prazo.
Análise
O discurso de Tarcísio, portanto, capitaliza sobre um sentimento difuso de que as "regras do jogo" se tornaram fluidas e imprevisíveis. Do ponto de vista do princípio da Ordem Institucional, a percepção de que decisões monocráticas podem se sobrepor a atos do Legislativo ou do Executivo sem um claro amparo constitucional gera uma instabilidade que corrói a confiança nas instituições. A fala do governador, embora contundente, não cria a crise; ela a diagnostica e busca liderar a resposta a ela. Trata-se do "cruzar do Rubicão" não como um ato de ruptura, mas como a aceitação de um papel de porta-voz de uma demanda por reequilíbrio institucional.
O Custo da Incerteza: Impactos na Economia
A crise institucional não é um debate abstrato confinado a Brasília. Ela tem um custo direto e mensurável para a economia brasileira, afetando a vida de todos os cidadãos. O princípio do Livre Mercado e da Eficiência Econômica pressupõe um ambiente de regras claras e previsibilidade, onde empreendedores e investidores possam tomar decisões de longo prazo. A atual tensão entre os poderes mina exatamente este fundamento.
Quando o Legislativo aprova uma reforma e o Judiciário a suspende por tempo indeterminado, ou quando contratos são revistos com base em interpretações que mudam ao sabor das circunstâncias, a segurança jurídica
– o principal ativo de uma economia moderna – se esvai. A retórica de Tarcísio, ao demandar um retorno à ortodoxia da separação de poderes, pode ser interpretada também como um chamado pela restauração de um ambiente propício aos negócios, à inovação e à geração de empregos.
Cenários Prováveis
- Cenário Base: A tensão persiste, com o Judiciário mantendo sua postura e o campo conservador se unificando em torno do discurso de Tarcísio. A incerteza política continua a ser um freio para o crescimento econômico, mantendo o PIB em um patamar medíocre de 1,5% ao ano.
- Cenário Otimista: O discurso serve como catalisador para um debate sério no Congresso Nacional sobre o papel e os limites do STF, resultando em emendas constitucionais que restabelecem o equilíbrio. A melhora na percepção de risco-país atrai novos investimentos, elevando o potencial de crescimento.
- Cenário Pessimista: A retórica escala de ambos os lados, levando a uma paralisia decisória e a uma crise aberta. O capital estrangeiro se retrai, a dívida pública se torna mais cara e o Brasil mergulha em mais uma década perdida.
Conclusão
O discurso de Tarcísio de Freitas em 7 de setembro de 2025 foi mais do que uma defesa de seu capital político; foi a articulação de uma tese sobre o Brasil. Uma tese conservadora que defende que sem Ordem Institucional, Estado de Direito e Separação de Poderes, não há prosperidade econômica sustentável nem Coesão Social. A proposta de anistia, embora controversa, insere-se nessa lógica como uma tentativa de encerrar um capítulo de conflitos para focar na reconstrução da normalidade e na resolução dos verdadeiros problemas do país.
Independentemente do futuro eleitoral de seus protagonistas, a encruzilhada apontada por Tarcísio é real. O Brasil precisa urgentemente encontrar um caminho de pacificação que passe, invariavelmente, pelo respeito mútuo entre os poderes e pela restauração da confiança nas instituições. A alternativa é aprofundar uma crise que já custou caro demais à nação.
Recomendações Principais
- [ ] Curto Prazo: Abertura de um canal de diálogo entre os chefes dos Três Poderes para reduzir a temperatura da crise e estabelecer um pacto de não agressão.
- [ ] Médio Prazo: O Congresso Nacional deve assumir seu protagonismo e pautar o debate sobre Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que aprimorem os mecanismos de freios e contrapesos, como a regulamentação de decisões monocráticas e a definição de mandatos para ministros de cortes superiores.
- [ ] Longo Prazo: Fomentar uma cultura de respeito à Constituição e aos processos democráticos, onde a solução para divergências políticas se dê primordialmente através do debate legislativo e do voto popular, e não pela judicialização da política.