Análise da Estratégia de Defesa do General Augusto Heleno no STF
Análise aprofundada da estratégia de defesa do General Augusto Heleno no STF, abordando os argumentos sobre nulidades processuais, a desconstrução da tese acusatória e a qualidade técnica da sustentação oral.

A sustentação oral do advogado Matheus Milanez, em defesa do general Augusto Heleno, destacou-se pela articulação de estratégias jurídicas robustas e argumentos técnicos bem fundamentados. A defesa concentrou-se em dois eixos principais: o questionamento de nulidades processuais e a desconstrução da narrativa acusatória, explorando tanto o mérito quanto os aspectos formais da ação penal.
I. Arguição de Nulidades Processuais
Um dos pilares da defesa foi a alegação de vícios que comprometeriam a validade do processo, com foco no cerceamento de defesa e na imparcialidade do julgador.
Volume Probatório e Cerceamento de Defesa: A defesa argumentou que o volume excessivo de provas — mais de 70 terabytes de dados — inviabilizou o pleno exercício do direito de defesa. A impossibilidade material de analisar a totalidade dos autos foi apresentada como uma violação direta aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, constituindo um sólido argumento processual.
Violação do Sistema Acusatório: O advogado questionou o desequilíbrio entre o número de perguntas feitas pelo relator (302) e pelo Ministério Público (59), utilizando essa desproporção para alegar uma suposta parcialidade judicial. Ao indagar sobre o papel do "juiz julgador" versus o "juiz inquisidor", a defesa invocou o princípio do sistema acusatório para contestar os limites da atuação do magistrado, um questionamento juridicamente pertinente.
II. Desconstrução da Tese Acusatória
No mérito, a estratégia centrou-se em desvincular o general do núcleo decisório do governo e reinterpretar as provas apresentadas pela acusação.
Afastamento Político e Divergência Ideológica: A defesa construiu uma narrativa de progressivo distanciamento político de Heleno, especialmente após a aliança do então presidente Jair Bolsonaro com o "Centrão". Provas documentais e testemunhais foram usadas para contextualizar a perda de influência do general. Como evidência dessa divergência, foi apresentada uma anotação pessoal de Heleno defendendo a vacinação de Bolsonaro, reforçando a tese de sua autonomia intelectual.
Ressignificação das Provas: A chamada "caderneta golpista" foi apresentada como um diário de anotações pessoais, sem caráter de planejamento oficial. A defesa alegou que as anotações não eram compartilhadas em reuniões e questionou a cadeia de custódia das provas. Adicionalmente, declarações públicas de Heleno, como a de que seria preciso "fazer algo antes das eleições", foram reinterpretadas sob uma ótica legalista e republicana, numa competente técnica de ressignificação dos elementos probatórios.
III. Fundamentação Jurídica e Qualidade da Apresentação
A defesa demonstrou rigor técnico ao embasar suas teses e ao comunicá-las de forma eficaz.
Invocação de Direitos e Estratégia Recursal: As nulidades alegadas foram fundamentadas em violações diretas a direitos constitucionais, como o direito ao silêncio (art. 5º, LXIII). Analistas apontam que a solidez desses argumentos estabelece uma base consistente para futuros recursos, inclusive em cortes internacionais, demonstrando um planejamento jurídico de longo prazo.
Técnica e Comunicação na Sustentação Oral: O uso de recursos visuais, como slides, foi empregado para elucidar pontos técnicos complexos. O advogado combinou linguagem jurídica precisa com expressões coloquiais estratégicas (como "toró de parpite"), demonstrando habilidade comunicativa para tornar os argumentos mais acessíveis e persuasivos.
Conclusão
A defesa do general Heleno construiu uma tese coerente, negando sua participação em qualquer articulação golpista com base na ausência de provas diretas e no seu progressivo isolamento político. A sustentação oral demonstrou notável qualidade técnica, estruturando uma defesa fundamentada em princípios constitucionais e processuais sólidos, com o objetivo de contestar tanto os aspectos formais quanto materiais da acusação.